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Texto do colunista Sérgio da Costa Ramos sobre a ACALI!

A Academia do Livro, que recentemente completou oito anos, merece os nossos cumprimentos pela perseverança com que renova o seu cardápio de tertúlias e organiza encontros que são pura festa para o espírito.
Para os escritores de Santa Catarina – com um certo e proposital exagero –, a Academia tem mais ou menos o mesmo significado do que a inauguração do Real Gabinete Português de Leitura, instalado no Rio de Janeiro com a vinda de dom João VI e as cortes.
A presidente da Acali, Dolores Oening de Andrade, tem estimulado a todos nós com este “vício bom”. E demonstra tanto apreço pelo livro quanto aquele grão-vizir da antiga Pérsia que insistia em carregar sua biblioteca enquanto viajava, acomodando-a em 400 camelos, treinados para andar em ordem alfabética.
Mesmo depois da Bíblia de Gutemberg, impressa em Mainz, 1450, o livro continuou a ser um bem tão raro quão precioso. Naqueles tempos, um livro era propriedade raríssima, privilégio para um pequeno punhado de leitores.
Ter um livro em casa era “chamar” a família e até a vizinhança para dele desfrutar, como se aqueles cadernos impressos fossem os aparelhos de televisão dos anos 1950: juntavam-se na mesma sala as pessoas da família e até os estranhos, os chamados “televizinhos”.
Famílias liam em grupo, geralmente antes do jantar – e até durante alguma pantagruélica refeição, Festa de Babette para outros sentidos além da audição.
Alberto Mangüel – que na infância lia para o cego Jorge Luis Borges – revela em seu livro A História da Leitura que ler “à mesa” não tinha a intenção de “distrair as alegrias do paladar”. Não. A ideia era juntar os dois prazeres:
– A leitura era mais um “prato”. Realçava a alegria do palato com uma diversão criativa, uma prática herdada dos tempos do Império Romano.
Como se vê, o livro já desempenhou papéis muito mais importantes no dia a dia da família, hoje obsedada pela caixinha eletrônica da televisão.
Mas “o universo é um grande livro e a vida é uma bela escola”, gostava de filosofar o doce poeta Mario Quintana. “Uma nação se faz com homens e livros”, sustentava, amparado por um espesso par de sobrancelhas, mestre Monteiro Lobato, lá pelos idos de 1950.
Ler é, talvez, o maior das habilidades do ser pensante e a engrenagem mais azeitada de toda a engenharia intelectual. Ler é tão importante quanto cada um dos outros cinco sentidos.
E apesar das novas embalagens eletrônicas em forma de livro, como as do Kindle da Amazon, o velho e bom livro tradicional continua sendo a mais completa das refeições do espírito.
Esse “prato” está sempre cheio e se multiplica, como os peixes de Cristo.

Fonte: Diário Catarinense, 18/12/2011.